um collo de cavallo ao rosto humano
Juntar quizesse alguem, e cravejasse Membros unidos de animaes diversos Com varias plumas, terminando as formas De uma bella mulher cauda de peixe; Quem não riria? Amigos indulgentes Desculpar não podiam tal delirio.
Crede-me pois, Pisões, isto é retrato De um livro que sem plano se fabrica, E qual sonho d'enfermo especies cria Que não teem connexão, pés ou cabeça Que convenha á figura projectada.
Poetas e Pintores tem licença, (Ora lha damos, ora lha pedimos) De fingir o que mais agradar possa: Excepto se contrarios unir querem ; E que nasçam as aves das serpentes, Que os tigres gerem as ovelhas mansas.
Inceptis gravibus plerumque et magna professis,
Purpureus, latè qui splendeat unus et alter
Assuitur paunus: cùm lucus et ara Dianæ, (2)
Et properantis aquæ per amonos ambitus agros,
Aut flumen Rhenum, aut pluvius describitur arcus. (3)
Sed nunc non erat his locus. Et fortasse cupressum
Scis simulare; quid hoc, si fractis enatat exspes
Navibus ære dato qui pingitur? Amphora cœpit
Institui: currente rotâ, cur urceus exit?
Denique sit quodvis simplex duntaxat et unum.
Maxima pars vatum (pater et juvenes patre digni)
Decipimur specie recti: brevis esse laboro,
Obscurus fio: sectantem lenia, nervi
Deficiunt animique: professus grandia, turget;
Serpit humi, tutus nimiùm timidusque procellæ.
Qui variare cupit rem prodigialiter unam,
Delphinum sylvis appingit, fluctibus aprum.
In vitium ducit culpæ fuga, si caret arte.
Essas obras pomposas que promettem Cousas grandes, ás vezes são retalhos De purpura e brocado, que alinhava Com arte o dono: como exemplo achamos A descripção das aras de Diana, No sacro bosque; o rapido remanso Que serpêa nos campos sombreados; O largo Rheno, e a luminosa estrada Onde, entre o sol e a chuva, Iris anda. Isto porém não é de que se tratta.
Tal pinta com primor raro um cypreste; Mas isso de que serve? se lhe pagam Para pintar ao vivo um naufragante, Salvo da rota náo, dos bravos mares?... Tal quer formar um vaso... o torno gira: Por que razão lhe sae um jarro tosco? É preciso unidade em qualquer obra, Principio, meio, fim, methodo, e graça.
Sabei pois, digno Pae, e filhos dignos, Que os mais dos Vates d'illusões vivemos, E apparencias do bem nos satisfazem: Se trabalho em ser breve, escuro fico; Se busco ser suave, a força, o nervo Na molleza e brandura se dissipam: O tom sublime, em turgido se troca; E se nimia cautela as phrases guia, Vai terra a terra, abaixa-se o discurso. E mil vezes aquelle que procura Variar seus assumptos, com portentos, Um golfinho me pinta nas florestas, Um javali nas ondas; e tropeça, Quando foge de um mal, n'outro mais grave, Se as regras necessarias não consulta.
Æmilium circâ ludum faber unus et ungues
Exprimet, et molles imitabitur ære capillos:
Infelix operis summà; quia ponere totum Nesciet. Hunc ego me, si quid componere curem,
Non magis esse velim, quàm pravo vivere naso, Spectandum nigris oculis, nigroque capillo.
Sumite materiam vestris, qui scribitis, æquam (4) Viribus, et versate diù quid ferre recusent,
Quid valeant humeri: cui lecta potenter erit res, Nec facundia deseret hunc, nec lucidus ordo. Ordinis hæc virtus erit, et Venus (aut ego fallor)
Ut jam nunc dicat, jam nunc debentia dici Pleraque differat, et præsens in tempus omittat; Hoc amet, hoc spernat, promissi carminis auctor. In verbis etiam tenuis cautusque serendis, Dixeris egregiè, notum si callida verbum Reddiderit junctura novum. Si fortè necesse est Indiciis monstrare recentibus abdita rerum; Fingere cinctutis non exaudita Cethegis Continget, dabiturque licentia sumpta pudenter; Et nova fictaque nuper habebunt verba fidem, si Græco fonte cadant, parcè detorta. Quid autem Cæcilio, Plautoque dabit Romanus, ademptum Virgilio, Varioque? Ego cur acquirere pauca
Perto do Circo Emilio, ignaro artista N'uma estatua fiel em bronze esculpta Perfeitamente as unhas, os cabellos: Mas no desenho desgraçado, ignora Como deve juntar de um todo as partes. A compor deste modo antes quizera Ter disforme o nariz, os olhos vesgos.
Pesai bem a materia que trattardes, Quando escreveis medi as vossas forças, Ensayai com que podem vossos hombros: Se o assumpto vos for proporcionado, Nunca vos faltará phrase eloquente, Ordem lucida, e graças no discurso. O merito das obras, a belleza Consiste em por no lugar proprio as cousas; Dizer antes o que antes dizer deve, Transpor aquillo que mais tarde agrada; Do que convem, usar; e omittir quanto, Sem graça ou força, inutilmente occorre.
Parco em palavras, delicado, e cauto, Ha de sempre agradar o auctor astuto Que os termos velhos remoçar com arte. E quando carecer de signaes novos Para novas idéas, for achá-los
Em thesouros ignotos aos Cethegos,
E arriscar sem temor um termo affouto.
Se a prudencia o conduz, o povo applaude, E as palavras de fabrica recente
Terão valor; e mais, se derivarem Com pouca corrupção, da Grecia, ou Lacio. Não penseis que os Romanos concedessem A Cecilius, a Plauto, o que negavam A Varius, a Virgilio; e que a mim mesmo
« ZurückWeiter » |